Na pilha de cartões de Natal que você enviará e receberá nesta temporada, talvez alguns deles tenham estas cinco palavras: “Espero que esteja tudo bem!”
É uma frase que costumamos incluir como forma de sermos educadas. Às vezes, enquanto escrevemos as palavras, nós as sentimos sinceramente; às vezes nós as adicionamos sem pensar muito. Mas quando somos nós que recebemos o sentimento, pode ser um alívio quando é apenas uma declaração no papel e não uma pergunta pessoal, especialmente quando não temos certeza de como responderíamos.
Está tudo bem com você?
- Sim, está tudo bem... exceto que estou me sentindo sobrecarregada/ cansada/ solitária/ perdida.
- Sim, está tudo bem... contanto que não estejamos discutindo meu novo diagnóstico / relacionamento à distância / decepção.
- Sim, está tudo bem... a menos que você não esteja se referindo à situação de trabalho / perda de emprego / doença mental / falecimento de meu familiar.
Tudo está bem?
A primeira vez que ouvi a música “Tudo está bem”, tudo estava bem. Eu estava no ensino médio e, quando o coral da minha igreja cantou a música, meu pai e eu amamos aquele louvor, mas não sabíamos de quem era a autoria. Minha mãe e eu descobrimos que era uma música de um dos CDs do Michael W. Smith, compramos então o CD e dei de presente pro meu pai no Natal.
Nos anos que se seguiram, foi um dos CDs que mais tocamos na nossa casa, e quando chegava a vez desse louvor em especial sempre tinha alguém para apertar o botão e repetir a música. Nós a repetíamos durante os Natais, mesmo quando tudo parecia estar dando errado; quando estávamos exaustos de cansaço, imaginando como era possível cantar as palavras:
“Está tudo bem, está tudo bem
Anjos e homens se alegram
Para esta noite, a escuridão caiu
No alvorecer da luz do amor”
Quando a temporada de fim de ano chega com sofrimento – quando a doença continua, quando enfrentamos a traição, quando um filho amado nunca volta para casa – ainda podemos cantar “está tudo bem”?
Novidades para um Rei
Recentemente me deparei com essas três palavras, “tudo está bem”, enquanto lia o Antigo Testamento. Se você conhece a vida de Davi, deve se lembrar de seu relacionamento complexo com seu filho Absalão. No final de 2 Samuel, Absalão se rebela e lidera uma revolta contra seu pai, forçando-o ao exílio.
Mas o golpe de Absalão falha. Em 2 Samuel 18, fica claro que o rei Davi poderá deixar o exílio e retornar ao seu trono. Quem vai informá-lo? Dois mensageiros: Um é Aimaás, o jovem mensageiro de Davi, que está ansioso para levar a notícia ao seu rei. A princípio, ele é persuadido a não ir, e um “etíope” não identificado é enviado à sua frente. Os estudiosos dão diferentes razões pelas quais Aimaás foi inicialmente impedido de lhe dar a informação. Independentemente disso, quando ele finalmente recebe o sinal verde, ele sai correndo e passou a frente do etíope até o rei.
Davi vê Aimaás correndo; ele já suspeita do que está por vir. Ele é um líder militar experiente, que viu inúmeras batalhas ao longo dos anos. Este não é um exército derrotado que está voltando, recuando em massa: é um homem, correndo o mais rápido que pode com uma boa notícia.
“Se vem sozinho, traz boas notícias”, diz o rei. “Este homem é de bem e trará boas notícias” (2Sm 18.27).
Aimaás chega, sem fôlego. Ele grita para Davi, cumprimentando-o com uma única palavra: Shalom. Em muitas das traduções, ele diz três palavras: “Tudo está bem”. Então ele presta homenagem ao rei com o rosto no chão.
É chocante ver aquelas palavras ali: “Tudo está bem”. A saudação nos faz, como leitores modernos, estremecer um pouco porque sabemos o que está por vir: o rei pode ter vencido esta guerra, mas foi à custa de seu amado filho.
Aimaás continua com sua mensagem em 18.28: “Bendito seja o Senhor teu Deus! Ele entregou os homens que se rebelaram contra o rei, meu senhor”. O Senhor soberano de Davi executou a justiça. Esta vitória é digna de celebração - e poderia ser, se Davi fosse apenas um governante insensível e não um pai também.
Davi pergunta a Aimaás: “Vai bem o jovem Absalão?” (18.29). Aimaás menciona um “grande distúrbio”, mas afirma que não sabe de mais nada, então Davi o afasta. O próximo mensageiro, o etíope, aparece, e a conversa deles começa de maneira semelhante, com a confirmação das boas novas da libertação de Deus.
“Que meu senhor, o rei, ouça as boas novas”, diz o homem. "Hoje o Senhor te livrou de todos que se levantaram contra ti.” (18.31). Mas o bem-estar da nação não é tudo com que Davi se preocupava. Ele perguntou, então, se seu filho Absalão estava bem.
A resposta do etíope é delicada, indireta e comovente: “Desejo que os inimigos do rei meu senhor, junto com todos os que se levantam contra ti com más intenções, se tornem como aquele jovem” (18.32).
O rei desmorona.
Em 2 Samuel 18.33, lemos que Davi “subiu à câmara acima do portão da cidade e chorou. Enquanto caminhava, ele gritou: ‘Meu filho Absalão! Meu filho, meu filho Absalão! Se ao menos eu tivesse morrido em seu lugar, Absalão, meu filho, meu filho!’”
Um retorno e uma ressurreição
Quando você passa algum tempo estudando a vida de Davi, você vê tudo: decepção, morte, sucesso, pecado, sofrimento, tristeza, graça e a generosidade de Deus. Todas essas experiências parecem vir à tona nesta noite escura, enquanto Davi enfrenta uma dor insondável.
Em meio a essa provação, Davi então se prepara para retornar a Jerusalém para retomar seu reinado. Alguns compararam o retorno de Davi a Jerusalém com a ascensão de Jesus após Sua ressurreição – depois de enfrentar a rejeição, o sofrimento e a morte, Jesus assume Seu lugar de direito no trono à direita do Pai.
Mesmo na perda, Deus reina. Ele é vitorioso.
Porque Ele reina, a dor que experimentamos não é sem propósito.
Porque Ele reina, há luz para as noites mais escuras.
Porque Ele reina, tudo está bem - um dia, veremos o mundo ser consertado.
Tudo está bem.
Neste Natal, se boas e más notícias chegaram a você como mensageiros emparelhados, enchendo esta estação de dor, que Deus a conforte com a perspectiva do céu e a encha da esperança de Cristo que a capacita a cantar “Aleluia, Tudo está bem!” de todo o coração.
“Oh, deixe minha alma trêmula ficar quieta,
E espera tua sábia, tua santa vontade!
Não posso, Senhor, ver teu propósito,
No entanto tudo está bem desde que governado por Ti.”
—Charles H. Spurgeon1
1 Tradução livre de: SPURGEON, Charles H. Morning and evening: daily readings. Londres: Passmore & Alabaster, 1896