Devo realmente honrar um político que não tem temor a Deus?

Se você escolhesse uma palavra que descrevesse a atitude mais importante da sociedade dos dias de hoje, tem uma que tenho certeza de que você não escolheria de imediato. A palavra é honra. Tão pouco é uma das palavras que descrevem muitos dos cristãos de hoje. Ao contrário, em uma variedade de frentes, os cristãos americanos estão divididos, combativos e até mesmo furiosos. Talvez eu esteja seguindo os comentaristas errados, mas eu realmente não vejo muita honra transpirando da comunidade cristã. E, na verdade, eu também luto com uma atitude de honra, mas eu devo lidar com isso em obediência.

Um escritor observou:

“O discurso político é a Las Vegas do cristianismo, um ambiente no qual nossos pecados têm uma escusa. O ódio é consenso, o medo é perpetuado e a rivalidade é aplaudida. Enlouqueça, seguidor de Cristo! Suas palavras não têm consequência aqui…. Não apenas os cristãos são desculpados por suas indiscrições políticas, como também são frequentemente aplaudidos por cometê-las. Calúnia é explicada como raiva justa, argumentos vencedores são mais valorizados do que os verdadeiros (estejam os “fatos” alinhados ou não), e aqueles que provocam dissensão são apontados para o púlpito.”¹

De fato, recentemente, tem me incomodado um pastor, do centro oeste, que está comprando outdoors em vários estados para denegrir publicamente nosso atual presidente. Nos outdoors ele contrasta, de um lado, versículos da Bíblia, e do outro lado, várias frases do presidente.  A intenção é mostrar que Donald Trump é uma pessoa desonrada e sem temor a Deus². Admito que, de muitas formas, nosso atual líder nacional não é uma modelo de virtude e, às vezes, vergonhoso com suas palavras e comportamento. Mas, nosso comportamento honroso como cristãos não depende da condição espiritual dos nossos líderes políticos. Independentemente de sua afiliação política, seja da direita ou da esquerda.

Um mandamento difícil, mas saudável

Nós não podemos ignorar o poder e a relevância do que Pedro ensinou quando os cristãos foram perseguidos e dispersos pela opressiva influência do hostil e extremamente ímpio, Império Romano. Pedro exortou: “Tratem a todos com o devido respeito. Amem os irmãos. Temam a Deus e honrem o rei.” (1 Pedro 2.17).

O Imperador Romano era ímpio e perverso. Muitos deles proclamaram-se deuses e exigiram adoração. Eram pervertidos sexualmente e abertamente travestidos. Assassinaram seus familiares e oponentes políticos. Alguns mataram cristãos agressivemente³. Ainda assim, Pedro ordenou aos cristãos que sempre honrassem o imperador. Isso pode ser difícil, mas é sempre essencial à santidade.

Mas nós recusamos. Toda vez que reagimos a um mandamento claro das Escrituras com um “sim, mas, porém, todavia…” é um indicador certeiro de confusão bíblica ou convicção absoluta, levando a uma desculpa esfarrapada para desobedecer. Então, quais são as chaves para viver com honra em um mundo desonrado? Eu vejo cinco.

1. A honra está enraizada no poder da nossa verdadeira identidade

No contexto mais amplo de 1 Pedro, capítulo 2, vemos algumas realidades fundamentais sobre nossa verdadeira identidade em Cristo, especialmente necessárias em meio a uma sociedade hostil.

“Vocês, porém, são geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus para anunciar as grandezas daquele que os chamou das trevas para sua maravilhosa luz. Antes vocês nem sequer eram povo, mas agora são povo de Deus; não haviam recebido misericórdia, mas agora a receberam. Amados, insisto que, como estrangeiros e peregrinos no mundo, vocês se abstenham dos desejos carnais que guerreiam contra a alma. Vivam entre os pagãos de maneira exemplar para que, naquilo em que eles os acusam de praticarem o mal, observem as boas obras que vocês praticam e glorifiquem a Deus no dia da sua intervenção…

Vivam como pessoas livres, mas não usem a liberdade como desculpa para fazer o mal; vivam como servos de Deus.” (1 Pedro 2.9-12, 16).

Note que nossa identidade em Cristo suplanta todas as questões terrenas de raça, religião, nacionalidade, ou quaisquer poderes temporais que existam. Nossa identidade transcende a influência passageira deste mundo. Filipenses 3.20 diz que nós somos “cidadãos dos Céus”. Meu amigo, Robbie Symons, gosta de dizer que somos “céuzenses”.

A opressão ou mau comportamento moral de qualquer poder político empalidece em comparação a nossa liberdade em Cristo e nossa lealdade final como servos de Jesus. Por isso que Pedro, antes de ordenar honra aos líderes políticos, pede que temamos a Deus. Somente Deus é digno de reverência, adoração e obediência. Quando compreendemos isso direito, os outros mandamentos tendem a fluir.

Como cristãos, quando esquecemos nossa verdadeira identidade, nós inevitavelmente atuamos a partir de uma praga confusa de insegurança pessoal que se manifesta em manipulações combativas e controladoras. Então nós lutamos com a virtude da honra. Sempre que nós começamos a nos identificar pessoalmente com rótulos, sejam eles políticos ou quaisquer outros, mais do que com a verdade atribuída a nós nas Escrituras, começaremos a nos comportar de maneiras que contradizem o evangelho.

2. A honra é essencial para o nosso testemunho pessoal

A honra é muito direta. É uma atitude interna de respeito, cortesia e estima. Nós somos ordenados, em muitos lugares, a honrar ao Senhor. Aos cristãos também é requerido que honrem uns aos outros (Romanos 12.10), os mestres terrenos (1 Timóteo 6.1), e nossos pais (Êxodo 20.12).

Enquanto a honra pode parecer difícil, ela é essencial ao autêntico testemunho do evangelho. Quando perdemos a honra do nosso coração, colocamos em risco nosso testemunho. Pedro esclarece:

“Vivam entre os pagãos de maneira exemplar para que, naquilo em que eles os acusam de praticarem o mal, observem as boas obras que vocês praticam e glorifiquem a Deus no dia da sua intervenção… Pois é da vontade de Deus que, praticando o bem, vocês silenciem a ignorância dos insensatos.” (1 Pedro 2.12,15).

Um coração de honra produz boas ações que podem levar os malfeitores a experimentar a salvação e glorificar a Deus. Nossas boas ações também deixam os tolos sem fala. Eu não tenho visto a ironia política alcançar nenhum desses resultados. Paulo afirmou como deveria ser a nossa atitude e testemunho, “Façam tudo sem queixas nem discussões, para que venham a tornar-se puros e irrepreensíveis, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma geração corrompida e depravada, na qual vocês brilham como estrelas no universo.” (Filipenses 2.14-15).

3. A honra é focada em seguir as pegadas de Cristo

Pedro prossegue para nos dar uma derradeira motivação para abraçarmos a honra quando ele declara que Cristo é nosso exemplo e que nós devemos “seguir os seus passos”. Para isso vocês foram chamados, pois também Cristo sofreu no lugar de vocês, deixando-lhes exemplo, para que sigam os seus passos. “Quando insultado, não revidava; quando sofria, não fazia ameaças, mas entregava-se àquele que julga com justiça.” (1 Pedro 2.21-23). A honra é cristã. Ofensas e ameaças não são. Confiar em Deus é a verdadeira obediência. Nós somos ordenados a praticarmos um discurso saudável que traga graça aos ouvintes. (Efésios 4.29). Nós somos sempre livres para honrar os princípios, mas não para atacar raivosamente as pessoas. Eu nem sempre gosto destes mandamentos, mas eu quero amar Aquele que os deu a mim e os exemplificou. Então, eu oro por graça.

4. A honra é atrelada à nossa confiança na suficiência do evangelho.

É tão interessante que, nas escrituras, nem Jesus e nem seus apóstolos jamais se queixaram ou condenaram a agressiva coerção da Roma pagã. Eles simplesmente disseram aos cristãos para pagarem os impostos (Marcos 12.17), orar pelos líderes políticos (1 Timóteo 2.2) e expressarem sua honra (1 Pedro 2.17). Como pode? Jesus e os jovens líderes sabiam o poder do evangelho para transformar famílias, comunidades e até mesmo os governantes. Paulo declarou: “Não me envergonho do evangelho, porque é o poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê” (Romanos 1.16). Ele descreveu Cristo e Seu evangelho como “o poder de Deus e a sabedoria de Deus” no mundo (1 Coríntios 11.18, 24). Mesmo da prisão, Paulo escreveu: “pelo qual sofro a ponto de estar preso como criminoso; contudo a palavra de Deus não está presa.” (2 Timóteo 2.9).

É claro que, na nossa sociedade, nós podemos e devemos votar. Nós podemos escolher atividades políticas entre suas múltiplas formas. Mas, em tudo isso, nossa esperança está no evangelho, não nos políticos, e nossa atitude é uma atitude de honra.

5. A honra é abraçada a partir de uma alta visão de soberania

Quando a igreja primitiva se deparou com a primeira onda de perseguição, eles se reuniram para orar. A primeira coisa que saiu de suas bocas não foi uma reclamação sobre a opressão que sofriam ou uma objeção a injustiça. Ao invés disso, eles declararam: “Ó Soberano, tu fizeste o céu, a terra, o mar e tudo o que neles há!” (Atos 4.24). Daquela reunião de oração eles tiveram um só desejo: “anunciavam corajosamente a palavra de Deus” (Atos 4.29-31).

Deus é soberano sobre os eventos humanos. Embora não possamos compreender totalmente, a verdade é que ninguém pode se tornar um líder político sem a vontade de Deus. Isto não significa que os líderes políticos sempre fazem a vontade do Senhor, mas que, no final das contas, Ele está no controle, supervisionando os eventos da humanidade. A Bíblia inclusive chama o rei pagão, Nabucodonosor, de “servo de Deus” (Jeremias 25.9). Ele estava longe de ter santidade mais ainda assim serviu aos propósitos de Deus. Enquanto raramente podemos confiar nas autoridades governamentais, nós podemos confiar e obedecer a Deus, inclusive no seu mandamento de honrar todos os homens.

É claro que quando o governo demanda que desobedeçamos aos mandamentos da Bíblia, nossa resposta direta e honrosa deve ser como a dos apóstolos: “É preciso obedecer antes a Deus do que aos homens!” (Atos 5.29). Isto nos levará a um sofrimento humilde e santo pelo evangelho.

Honra, Humildade e Esperança

Nossa esperança no evangelho é mais poderosa do que qualquer solução política, líder ou partido. Jesus foi “morto” pelo governo do seu tempo e ressuscitado por Deus. Essa esperança destrona poderes (visíveis e invisíveis) e nos compele a orar “venha o Teu reino, seja feita a Tua vontade na terra.” Quando Roma anunciou que César era o Senhor, os cristãos declararam: “Jesus é o Senhor!” Eles o fizeram com humildade, honra e, certamente, com esperança numa realidade superior – na realidade de um evangelho que transforma o mundo.

E nós também podemos.


¹Bryan Roberts, “7 Things Christians Need to Remember About Politics,” RELEVANT, August 14, 2020, https://www.relevantmagazine.com/current/7-things-christians-need-remember-about-politics/.

²“Detroit Free Press – Michigan Billboard Campaign Contrasts Trump’s Words against Jesus’,” Vote Common Good, October 13, 2020, https://www.votecommongood.com/detroit-free-press-michigan-billboard-campaign-contrasts-trumps-words-against-jesus/.

3 “The 8 Bloodiest Roman Emperors in History,” HistoryExtra, October 22, 2020, https://www.historyextra.com/period/roman/worst-bloodiest-emperors-history-tiberius-nero-commodus-caligula-domitian/

Sobre o Autor

Daniel Henderson

Daniel Henderson é o presidente da Strategic Renewal, um ministério dedicado a auxiliar congregações em todo os Estados Unidos e mundo a experimentarem renovação. Com frequência, ele lidera encontros de oração coletiva e é autor de vários livros sobre oração e liderança bíblica. Daniel também serve no conselho de diretores da National Association of Evangelicals e é o líder fundador da The 6:4 Fellowship, uma coalizão de pastores comprometidos com a oração e o ministério da Palavra (baseado em Atos 6.4).